O Estado do Paraná conseguiu reverter uma sentença na Justiça Federal e garantiu que as Cataratas do Iguaçu, uma das 7 Maravilhas Naturais do Mundo, agora também é 100% paranaense, com o reconhecimento oficial do título de propriedade e domínio da área com 1.085,3280 hectares constituída pela pelos Saltos de Santa Maria, dentro do Parque Nacional do Iguaçu.
O espaço delimitado em questão abrange a área brasileira do conjunto de quedas na fronteira com a Argentina, incluindo o tradicional Hotel das Cataratas. “Sem dúvida, uma conquista na área jurídica histórica para Foz do Iguaçu e todo povo do Paraná”, celebrou o advogado e consultor legislativo Gilmar Cardoso, que acompanha o trâmite da ação.
O atual contrato de concessão do Parque Nacional do Iguaçu, foi vencido pelo maior lance por um prazo de 30 anos por R$ 1.926.758.253,97, pelo Consórcio Novo PNI, que é formado pelo Grupo Cataratas que já era gestor do parque e pela Construcap [empresa que é concessionária do parque Ibirapuera, em São Paulo].
A normativa prevê que 7% da receita operacional bruta obtida pela concessionaria deve ser recolhido mensalmente ao órgão gestor (ICMBio) e em caso de vitória do Estado do Paraná, esses recursos entrariam nos cofres públicos paranaenses, gerando emprego, renda e movimentando a economia estadual, destaca o advogado Gilmar Cardoso.
“A arrecadação onerosa a ser paga pelo ICMBio, antes da Lei Estadual 20.222/2020 criada a partir de um projeto do deputado Luiz Fernando Guerra, era gratuita, mesmo sendo do Estado”, ressalta o advogado. Após isto, a União entrou com ação para derrubar a propriedade do Estado, “para manter a taxa de administração pela gestão do parque, paga pela concessionária sob sua titularidade”.
Como foi a decisão?
A decisão em sessão presencial na quarta-feira (5) da 12ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF4), com sede em Porto Alegre (RS), ocorreu por unanimidade e acompanhou o voto do Desembargador-Relator Luiz Antonio Bonat e deu provimento para o Recurso de Apelação impetrado pelo Estado do Paraná no processo onde a União.
A iniciativa, através da Advocacia Geral e do ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, buscava o cancelamento da Matrícula nº 35.598, do 2º Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Foz do Iguaçu, do imóvel que sedia o Parque Nacional e onde está instalado o Hotel das Cataratas, em nome do Estado do Paraná.
O advogado explica que neste processo as partes pleiteavam o cancelamento da Matrícula nº 35.598, em nome do Estado do Paraná, do 2º Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Foz do Iguaçu/PR, referente aos “Saltos de Santa Maria”, para o resguardo do patrimônio público federal, sustentando que as terras em litígio, estando situadas na faixa de fronteira de 66 Km, integravam, quando da titulação pelo Estado do Paraná, o patrimônio da União.
Alegavam que a área total de 1.085,3280 hectares, constituída pelos Saltos de Santa Maria, foi indevidamente registrada em nome do Governo do Estado do Paraná. Gilmar Cardoso descreve que em parecer, manifestou-se o Ministério Público Federal pela anulação da sentença da Justiça Federal de 1º grau com sede em Foz do Iguaçu, e, no mérito, pelo provimento da apelação, para que, nos termos do art. 1.013, § 3º, II, do CPC, fosse julgada improcedente a demanda e mantida a posse da área para o Estado.
O Desembargador-relator citou que quanto à alegada titularidade da área pela União, ressalta-se que a Constituição de 1891 transferiu aos Estados a propriedade das terras devolutas, mantendo no domínio da União apenas aquelas indispensáveis à defesa das fronteiras, fortificações, construções militares e estradas de ferro federais.
“Assim, entende-se que a área em questão não é devoluta, já que foi concedida pelo Ministério da Guerra a Jesus Val na antiga Colônia Militar do Iguaçu, e no momento em que a área foi titulada pelo particular, se incorporou ao domínio privado perdendo o caráter devoluto (artigo 3º da Lei 601/1850 e artigo 5º do Decreto-lei 9.760/1946), sendo o título definitivo expedido em consonância com o artigo9º da Lei 733/1900.
Portanto, inaplicável o entendimento da Súmula 477 do STF sustentado pela União, no sentido de que “As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelos Estados, autorizam, apenas, o uso, permanecendo o domínio com a União, ainda que se mantenha inerte ou tolerante, em relação aos possuidores”.
Nesse contexto, impõe-se a reforma da sentença e a improcedência da ação ajuizada pela União. Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação”, afirmou textualmente em seu voto o Desembargador-Relator Luiz Antonio Bonat, tendo sido acompanhado pelos Desembargadores Federais João Pedro Gebran Neto e Gisele Lemke.
A Desembargadora Gisele Lemke, inclusive, fez registro do voto afirmando que uma questão que entendia pertinente destacar do voto do Relator é a que diz respeito à alegada doação das terras do estado do Paraná para a União por ocasião da constituição do Parque Nacional do Iguaçu, o que se deu por meio do Decreto-Lei n 1.035 de 10/01/1939.
O fundamento da União para alegar que teria havido a doação dessa área de terras está na exposição de motivos de referido Decreto-Lei de criação do Parque Iguaçu, em que há menção a uma suposta doação feita pelo estado do Paraná à União para a instituição do Parque Nacional. Ocorre que não há nessa exposição de motivos referência ao número do Decreto por meio do qual tal doação teria sido feita e, dada oportunidade à União para comprovar a existência de um Decreto do estado do Paraná que teria realizado essa doação, tal prova não foi trazida aos autos.
Assim, considerando que não se pode admitir a existência de uma doação apenas referida na exposição de motivos de ato legislativo editado pelo donatário, sem a comprovação de sua efetiva realização pelo doador, tem-se que não há prova da doação, razão pela qual se conclui que as terras em discussão permanecem na propriedade do estado do Paraná”, reiterou.
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002630-08.2018.4.04.7002/PR
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ ANTONIO BONAT
APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (INTERESSADO)
APELADO: UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (REQUERENTE)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE CANCELAMENTO DE MATRÍCULA IMOBILIÁRIA. PARQUE NACIONAL DO IGUAÇU. CONCESSÃO DA POSSE AO PARTICULAR PELO MINISTÉRIO DA GUERRA. SÚMULA 477 DO STF. INAPLICABILIDADE.
- O imóvel, cuja matrícula pretende a União o cancelamento, situa-se à margem do Rio Iguaçu, junto aos “Saltos de Santa Maria, na fronteira com a Argentina, e foi objeto de colonização a cargo do Ministério da Guerra, no início do século XX, sendo atribuída a posse a particular, conforme Título Definitivo da Colônia Militar de Foz do Iguassu. Posteriormente o particular vendeu o imóvel ao Estado do Paraná.
- Não tendo sido as terras concedidas pelo Estado do Paraná, inaplicável o entendimento da Súmula 477 do STF, impondo-se a reforma da sentença e a improcedência da ação declaratória ajuizada pela União.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 05 de fevereiro de 2025.