Projeto que tramita na Câmara Federal é manobra para reabrir um antigo caminho no Parque Nacional do Iguaçu fechado pela Justiça
Cenário de contemplação e contato com a natureza para pessoas do mundo todo, as Cataratas do Iguaçu foram palco de protesto, nesta terça-feira, 8, contra um projeto que prevê a abertura de uma estrada no Parque Nacional do Iguaçu (PNI). A mobilização segue pelas redes sociais.
Organizada pela Associação de Desenvolvimento de Esportes Radicais e Ecologia (ADERE) e por um coletivo de ambientalistas, a manifestação ocorre quando tramita a urgência do Projeto de Lei (PL) 984/19, do deputado federal Vermelho (PSD-PR). A proposta pretende cortar ao meio o parque que abriga as Cataratas do Iguaçu.
Os participantes do ato público percorreram as passarelas que levam aos principais pontos de visitação e saltos das maravilhas mundiais da natureza. Eles exibiram faixas imensas com a mensagem #EstradaDoColonoNão e inscrições denunciando o projeto de autoria do parlamentar paranaense.
Os ambientalistas consideram a iniciativa uma manobra legislativa para reabrir um antigo caminho no parque, fechado por ordem da Justiça há duas décadas. A estrada ilegal ficava entre Serranópolis e Capanema, no Oeste do Paraná, e vinha sendo amplamente utilizada para o transporte de ilícitos.
Para as organizações de proteção ambiental, o PL é uma autorização para o desmatamento da floresta de Mata Atlântica, em uma extensão de 17 quilômetros lineares. “Essa rodovia proposta pelo deputado Vermelho rasgaria ao meio o Parque Nacional do Iguaçu”, denuncia o gestor da ADERE, Raby Khalil.
Seria um retrocesso com prejuízos ao meio ambiente e ao desenvolvimento e turismo da região, prossegue. “O título de Patrimônio da Humanidade concedido pelas Nações Unidas, fator que contribui para atrair visitantes e à sua conservação, estaria sob risco com a intervenção em uma área intangível do parque”, frisa.
“Queremos sensibilizar os deputados federais e as forças políticas para que derrubem esse projeto imediatamente”, expõe Raby Khalil. “Mas estamos prontos para levar a defesa do Parque Nacional do Iguaçu e a nossa biodiversidade única às últimas consequências, sem medo de radicalizar”, conclui o ativista.
Rodovia, não estrada-parque
A diretora-executiva da Rede Pró-Unidade de Conservação (Pró-UC), Angela Kuczach, desmonta a falsa argumentação de que o objetivo é construir uma estrada-parque. “O deputado Vermelho está querendo construir uma rodovia rasgando o Parque Iguaçu”, aponta.
Segundo ela, o projeto é um engodo, uma deturpação de conceitos que afetarão negativamente os 14 municípios do entorno da unidade de conservação. “Em qualquer lugar do mundo, estrada-parque é uma via que serve para proteger uma beleza cênica, jamais uma estrada que rasga um parque ao meio, o desmatando”, pontua.
“Se o objetivo do deputado fosse o de promover desenvolvimento, ele trabalharia para a duplicação da BR-163, que liga Francisco Beltrão a Cascavel, a qual permite o escoamento de produtos e cargas”, assevera. “Outra forma é apoiar os benefícios do turismo defendendo o parque, e não incentivando a sua destruição”, sublinha Angela Kuczach.
Liberação geral para estradas
Integrante da organização ambientalista WWF-Brasil, Warner Bento Filho afirma não haver justificativa para tratar o assunto de forma atropelada. “É um projeto que permite a abertura de estradas em todas as unidades de conservação do Brasil, o que representa uma ameaça sem precedentes”, declara.
As pessoas e a ciência precisam ser ouvidas, defende. “Não faz sentido tratar desse assunto com urgência no momento em que o presidente do Ibama está afastado do cargo, o ministro do Meio Ambiente está praticamente foragido, e uma comissão estuda acabar com o ICMBio”, enfatiza o especialista em políticas públicas.
Improbidade legislativa
O diretor-executivo do Observatório de Justiça e Conservação (OJC), Giem Guimarães, inclui outro elemento no debate contra o PL 984/19, que é a judicialização. Sustenta ele que políticos podem incorrer em ato de improbidade quando aprovam leis para beneficiar grupos e não a coletividade.
Giem lembra que o Supremo Tribunal Federal (STF) negou o último recurso que pedia a reabertura da Estrada do Colono, no ano passado, sem que as partes possam recorrer da decisão. “A Constituição prevê que ‘a lei não prejudicará a coisa julgada’, princípio que procura dar segurança jurídica às nossas instituições”, ressalta.
O diretor do OJC cita que a Justiça, no fechamento definitivo da estrada, em 2001, recebeu provas técnicas mostrando que cidades da mesma região não afetadas pela possível via tiveram índices de desenvolvimento igual ao das principais interessadas na sua construção. “A desculpa da necessidade de desenvolvimento econômico tampouco se sustenta”, conclui Giem Guimarães.
Fotos: Marcos Labanca