Uma conversa com Vinicius Sgarbe sobre opinião no jornalismo.
Por Pedro Ribeiro, no Paraná Portal
Esta semana tive o prazer de conversar com o jornalista Vinicius Sgarbe, cujos artigos sou leitor porque sei que ali, nas entrelinhas, sempre encontraremos algumas frases de reflexão sobre nossa profissão. Muitas vezes é preciso consultar o Google ou o Aurélio, pois o jovem jornalista é de uma cultura diferenciada. Um arcanjo das letras, pois, pelo que percebo, também é um homem de fé. Acompanhe nossa conversa especial para o Lab Jornalismo 2050.
Sgarbe: Pedro, nós conversamos há tanto tempo, e há tanto tempo jamais nos vimos pessoalmente, que tenho a impressão que voltamos aos anos 90, com a ideia do web-amigo — risos. Algo que nos une frequentemente, de volta à realidade deste um artigo de opinião, é o jornalismo, especialmente, que ironia, os artigos de opinião. Isso me faz lembrar do ídolo Gladimir Nascimento. Ele nos impedia, iniciantes que éramos, de colocar opiniões de ouvintes no ar sem um critério de respeito ao indivíduo que emitiria a opinião e ao que a ouviria. Algo como os filhos de Noé cobrindo o velhinho que tinha se passado com bebida. Em tendo introduzido o assunto da pior maneira, pergunto se você acha que a imprensa de 2022 faz bem ou mal de deixar passar tanta gente jegue no papel de colunistas, entrevistados, etc. Não seria o caso da gente evitar expor esses irmãos ao ridículo?
Pedro Ribeiro: Caro jornalista Vinícius Sgarbe. Ao falar com você, este velho sobrevivente das letras, ou da pena, como diz Nilson Monteiro, se sente gratificado e na certeza de que sairá daqui com aprendizado e conhecimento. Ao ser homenageado como uma das “Vozes do Paraná”, na coleção de personalidades paranaenses do professor Aroldo Murá, e agora falando com você, até acho que tenho um pouco de importância ou história no nosso jornalismo, onde comecei na Gazeta do Povo há 45 anos. Um pouco. Só.Artigos de opinião! Você não tem ideia de quantos chegam para mim por dia no Paraná Portal. Cada um de arrepiar. Por isso, depois de um filtro, os que acho interessante, coloco no rodapé: este artigo não representa, necessariamente, a opinião deste jornal e é de pura responsabilidade de seu autor. Hoje, caro Sgarbe, com as redes sociais e o chamado jornalismo cidadão, todo mundo tem contribuído, de uma forma ou outra, com “opinião”, para a construção da democracia e na esfera pública. Cada um tem sua razão. São artigos que, em muitos casos, suscitam debates, radicais ou não, e geram muitas polêmicas. Cada um que escreve um artigo, tem plena confiança de que a sua opinião está correta e, as vezes, temos exemplos dogmáticos. Não podemos, jamais, confundir artigos de opinião com reportagens jornalísticas, pois, para mim, o jornalismo, embora seja um espaço de contraponto, seu compromisso é com a verdade, com a reportagem dos fatos, devidamente investigados. É neutro. Tem seus valores de liberdade, dignidade, respeito e abertura ao contraditório. Jornalismo, para mim, meu caro amigo, é o pilar da democracia. Sem jornais não existe democracia. É difícil você ter que, por exemplo, dizer a um colega, que o artigo dele não passa de um release de interesse pessoal ou patronal. Ele pode se ofender. Prefiro, dizer que “o conselho de redação vai avaliar” (risos).
Sgarbe: Hoje, eu encontrei um desses cortes de podcast em que um homem diz “burro é quem não muda de opinião”. Até me lembra o anúncio do cigarro Free. Penso que aquele homem está certo. Podemos redecidir uma opinião com base em novos fatos. Estou lendo um livro ótimo do Bion, “Aprender da experiência”, um texto psicanalítico. Eu me pergunto frequentemente, diariamente, o que aprendi, afinal. Uma das coisas e que o sarcasmo pode fazer muito mal às relações interpessoais. Com essas relações prejudicadas, fica mais difícil transferir conhecimento. Considero que o sarcasmo pode até mesmo ser um empecilho para quem está procurando por uma verdade. O que argumento é que não podemos, nós, jornalistas, suportar o peso de um único ponto de vista, temos de sair da escravidão da “lacrolândia”. Uma opinião forte é bem-vinda — muito diferentemente dos comentários bobos que âncoras podem fazer porque não têm o que dizer. Para uma opinião forte se requer um indivíduo forte, uma “mulher inteira”, um “homem inteiro”. Parece difícil para o jornalista de 2022 entender que ele não precisa, que continua não precisando, salvar a lavoura da mídia, que os papéis comerciais e editoriais estão muito bem sedimentados. Ele tem de fazer o trabalho dele, ser amado pelas pessoas da própria família, pelos amigos, mas que não precisa implorar por sucesso quando noticia.
Pedro Ribeiro: Deixar um pensamento radical, intolerante e mudar com convicção, não é vergonha, pelo contrário, é saber reconhecer que a terra é redonda e não plana, que a fila anda. É saudável, faz bem para a alma. Fazer uma reflexão e autocrítica sobre pontos de vistas oxigena nosso cérebro e nos faz seguir um caminho verdadeiro. Nosso país, uma das maiores democracias do mundo, exige isso. É um país que experimenta e respira liberdade, pelo menos no jornalismo pós-ditadura. O que vemos são algumas coisas pontuais como intolerância sobre urnas eletrônicas, tentativas de golpe, coisas pequenas que não chegar a arranhar o sistema democrático. Nada violento. A opinião é livre, mas a burrice é imperdoável, porque você tem tempo para aprender e inovar. Como jornalista que escreve editoriais (artigos de opinião própria e da linha de pensamento do jornal), eu erro e procuro corrigir meus erros e, às vezes, mudando de opinião. Isto não é vergonhoso para mim. Muitos amigos me perguntam: você vai votar no ladrão? Respondo com peito estufado de jornalista não engajado que voto em quem é o melhor e, no nosso caso, hoje, em quem é menos ruim. O ladrão, pode ter aprendido no pau de arara, com chicotadas nas costas, mas o burro, o radical é pior. Esta é minha “opinião” e posso mudá-la se alguém me provar que teremos, do outro lado, um programa econômico e social para nosso país que privilegie a camada fina da sociedade e não os poucos mais de 500 congressistas e outros 55 mil autoridades que tem foro privilegiado. Orçamentos secretos, dinheiro a rodo do Fundo Eleitoral. Isto não combina com minha linha de pensamento jornalístico. Neste caso, sou até radical e as vezes exagero na mão. Mas não dobro os joelhos. Vejo muitos colegas jornalistas de hoje que têm uma linha correta e rezam pela cartilha do bom jornalismo como aquele que jura com a mão na Bíblia ou diante da Justiça, em dizer a verdade, somente a verdade. Nosso país está carente de lideranças. O Brasil, hoje, é o retrato do seu próprio retrovisor, ou espelho. Um abraço, Sgarbe.
Sgarbe: Obrigado pela aula, Pedro! Abraço.