Ao longo dos seus mais de 16 mil km de extensão em fronteiras, o Brasil tem 33 cidades gêmeas (14 delas interligadas por pontes) entre seus 588 municípios localizados na faixa de fronteira (2 destes com conexão via ponte com o outro lado da fronteira).
O antigo Ministério da Integração Nacional, por meio da portaria 213, de 19 de julho de 2016, estabeleceu que “Serão considerados cidades gêmeas os municípios cortados pela linha de fronteira, seja essa seca ou fluvial, articulada ou não por obra de infraestrutura, que apresentem grande potencial de integração econômica e cultural, podendo ou não apresentar uma conurbação ou semi-conurbação com uma localidade do país vizinho, assim como manifestações “condensadas” dos problemas característicos da fronteira, que aí adquirem maior densidade, com efeitos diretos sobre o desenvolvimento regional e a cidadania”. Já a faixa de fronteira, é caracterizada como “a faixa de até cento e cinquenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres” (Constituição Federal, artigo 20, parágrafo 2º).
A quem hoje consegue visualizar toda a movimentação transfronteiriça proporcionada por uma ponte, fica mais difícil imaginar como estes locais seriam se não houvesse tal estrutura física. A cidade de Foz do Iguaçu (Paraná, Brasil) sem a Ponte da Amizade (Paraguai) ou sem a Ponte da Fraternidade (Argentina) teria qual dinâmica econômica e social? Como seriam escoadas as produções agrícolas de ambos países? Como o Brasil exportaria veículos, máquinas agrícolas e derivados de celulose para o Paraguai?
Na fronteira entre Foz do Iguaçu e Paraguai, por exemplo, a estimativa é de que passem pelo local 80 mil pessoas e trafeguem pela Ponte da Amizade 40 mil veículos por dia. Em relação aos caminhões, em outubro deste ano foi registrado o recorde de mais de 1500 carretas em um dia passando pelo local.
Segundo Camilo Pereira Carneiro, Doutor em Geografia, Professor adjunto na Universidade Federal de Goiás e pesquisador do IDESF, a fronteira pode ser classificada como uma zona de contato entre domínios territoriais distintos, que são regidos por sistemas jurídicos e econômicos diferentes, mas com inúmeras possibilidades de intercâmbio entre culturas heterogêneas. “As interações transfronteiriças ocorrem, sobretudo, nos centros urbanos localizados sobre o limite internacional, as chamadas cidades gêmeas, que exercem influência econômica, cultural e política em territórios que se estendem por uma zona de fronteira que supera os limites municipais e nacionais”.
As pontes e o desenvolvimento das regiões de fronteira
É possível que nas fronteiras ocorram processos de integração espontânea, nas quais o Estado intervém pouco. Porém, estimular tais dinâmicas fronteiriças, principalmente com o investimento em infraestrutura e articulação transfronteiriça, aceleram o protagonismo das fronteiras como zonas de interação, deixando de ter uma condição periférica. O Presidente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras, Luciano Stremel Barros, comenta que em geral “as fronteiras são vistas como regiões periféricas, mas deveriam ser vistas como portais de entrada, como oportunidades de desenvolvimento turístico, de biodiversidade e de novos negócios”.
Na América do Sul, o Brasil faz divisa com 10 países e tem 9 fronteiras trinacionais. No mapa, a área em verde representa a faixa de fronteira e é possível verificar que ainda há 4 países limítrofes (Peru, Bolívia, Paraguai e Argentina) com diversas cidades gêmeas conectadas exclusivamente por balsas.
Em um resgate histórico acerca da infraestrutura de pontes nessas regiões, Camilo explica que entre os anos de 1985 e 2011 foram erguidas 8 pontes. “Duas estruturas importantes foram construídas na década de 1940, a de Uruguaiana e, em 1965, a Ponte da Amizade. Já a ponte entre o Brasil e a Guiana Francesa foi concluída em 2011, apesar de só ter sido aberta em 2017, em função da ausência de um tratado entre os dois países”.
Atualmente, duas pontes trazem expectativa quanto às interações que possibilitarão nas regiões onde serão construídas. A Ponte da Integração (Rio Paraná), que ligará Foz do Iguaçu a Presidente Franco (Paraguai), será inaugurada em 2022. Outra ponte que está prevista para ser construída é entre as cidades de Porto Murtinho (MS) e Carmelo Peralta (Paraguai), sobre o Rio Paraguai.
Luciano analisa que a Ponte da Integração, que já está com 64% de execução da obra, desencadeará mais infraestrutura tanto para o Brasil quanto para o Paraguai, com maior viabilidade para o trânsito de caminhões que passam pelo maior Porto Seco da América Latina, além do aprimoramento dos mecanismos fiscalizatórios. “Essa nova ponte representa para nós fluidez no comércio internacional e conforto ao turista que transita pela Ponte da Amizade. Uma ponte mais voltada para o trânsito de cargas vai proporcionar um avanço gigantesco no comércio exterior e servirá não apenas para incrementar o crescimento da nossa região, mas também do Brasil e Paraguai”.
A cooperação transfronteiriça e cenários futuros
A fronteira com a Argentina é a que apresenta a maior quantidade de pontes que fazem a interligação entre os dois países. São seis estruturas: quatro delas localizadas em cidades gêmeas, nas cidades de Uruguaiana (RS) e Paso de Los Libres, São Borja (RS) e São Tomé, Santo Antônio do Sudoeste (PR) e San Antonio, Foz do Iguaçu (PR) e Puerto Iguazú e duas em municípios que ficam na faixa de fronteira, entre as cidades de Paraíso (SC) e San Pedro e Capanema (PR) e Andresito. “A partir da redemocratização do Brasil e Argentina, houve uma reaproximação dos dois países. Entre os anos 1980 até 2011, tínhamos a integração como prioridade e justamente temos uma grande quantidade de pontes construídas nesse período”, destacou Camilo.
Na fronteira com o Uruguai são três pontes, com o Paraguai são duas (não contabilizadas aqui a Ponte da Integração – Foz do Iguaçu/PR e Presidente Franco/PY, que está em obras e a ponte que vai ligar a cidade de Porto Murtinho/MS e Carmelo Peralta/PY, que está em fase de trâmites contratuais). Além destas, duas pontes fazem a interligação entre Corumbá (MS) e Brasileia (AC) à Bolívia, uma ponte fica entre Assis Brasil (AC) e Peru, uma entre Bonfim (RR) e Guiana e outra sobre Oiapoque (AP) e Guiana Francesa.
Além das abordagens relacionadas à infraestrutura nas fronteiras, Camilo comenta sobre as articulações necessárias para fortalecer a integração e o desenvolvimento nessas regiões. “Nós temos os acordos de localidade fronteiriça do Brasil com o Uruguai, Paraguai, Argentina e Bolívia, mas eles têm que fazer parte da legislação dos países e para isso acontecer, o Congresso de cada um deles tem que aprovar e incorporá-los na legislação”. Camilo também explica que pode-se resgatar projetos que o Brasil já tem para as fronteiras, voltados para educação, saúde e geração de emprego. “Tivemos iniciativas interessantes como o Sistema Integrado de Saúde das Fronteiras (SIS FRONTEIRAS), que destina recursos na área de saúde para os municípios que atendem brasileiros que vivem em outros países e projetos na área de educação. Precisamos de iniciativas que reforcem o potencial de desenvolvimento das fronteiras”.