Colit: um longo ponto de discórdia no Litoral do Paraná

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Uma jabuticaba paranaense. Assim pode ser definido o modelo, há até pouco tempo vigente, do Conselho de Desenvolvimento Territorial do Litoral do Paraná (Colit). Não há em outros estados uma estrutura não técnica capaz de interferir em licenciamentos ambientais. Ou seja, é uma exclusividade local, em comparação com a fruta nacional, usada para exemplificar toda vez que os brasileiros fazem uma adaptação à moda da casa, que só existe em terras tupiniquins. As informações são da Gazeta do Povo.

Com a configuração que foi ganhando ao longo do tempo, o Colit virou uma unanimidade em descontentamento. Os grupos mais preocupados em acelerar investimentos no Litoral o viam como uma instância que freava projetos, tendo em vista que o conselho tem, entre seus componentes, integrantes da sociedade civil organizada, como pesquisadores e membros de organizações não governamentais. Do outro lado, quem esperava uma posição mais técnica na avaliação dos projetos encontrava uma composição majoritariamente política – com quantidade de membros suficiente para aprovar qualquer iniciativa de interesse governamental.

Como estratégia para colocar fim ao cabo de guerra, o governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD) assinou um decreto em fevereiro modificando as atribuições do Colit. Basicamente, tirando do conselho o poder de dar a anuência a licenciamentos ambientais. A medida é passível de contestação judicial – já anunciada por grupos que, embora critiquem o conselho, o enxergavam como a única arena de discussão pública de projetos. Ratinho Junior havia prometido durante a campanha eleitoral, em entrevistas dadas a veículos de comunicação do Litoral, que iria acabar com o Colit. O decreto não encerrou as atividades, mas esvaziou o conselho sem apontar o que será dele a partir de agora.

Histórico: voltar no tempo para entender

Para entender como o Colit se transformou num ponto de discórdia é preciso voltar no tempo. Na década de 80, foram publicados dois decretos relacionados: um que considerava o Litoral como Zona de Interesse Turístico e outro sobre o Macrozoneamento, com um diagnóstico das áreas ocupadas e preservadas, definindo que tipos de atividade poderiam ser desenvolvidas em cada uma das macrozonas.

Surge aí o Colit, com a função não de licenciar, mas de garantir que o macrozoneamento fosse seguido, trabalhando o ordenamento territorial. Na época, o conselho inclusive auxiliou na construção dos planos diretores dos municípios, com a exceção de Pontal do Paraná – que só estruturou as regras muito mais tarde.

O conselho contava com câmaras técnicas e funcionários, como arquitetos e historiadores. Excepcionalmente, o Colit autuava e embargava obras que estariam em desacordo com as regras do zoneamento. Também teve uma função gestora, para viabilizar soluções coletivas para a zona costeira. Ao invés de pensar num empreendimento isolado, avaliava o conjunto de ações no território.

O órgão ganha atribuições a partir de 2008, quando o Conselho Estadual de Meio Ambiente (CEMA) determina que todo licenciamento do Litoral do Paraná tenha anuência do Colit. Não para relicenciar ou discutir os critérios. A função seria enviar o licenciamento para a câmara técnica e verificar se o empreendimento estava em conformidade com o planejamento territorial proposto – que em nada tem relação com as exigências obrigatórias da licença ambiental.

O Ministério Público percebeu que os processos não estavam passando pelo Colit e apontou isso em ações judiciais. Foi quando o CEMA decidiu reconfigurar o órgão, em 2016, com caráter mais político e menos técnico, com participação de prefeitos, por exemplo. Começaram aí as dificuldades para conseguir reunir todas as partes e analisar vários casos na mesma sessão. A digitalização integral dos processos parou de ser feita e cada vez os pareceres eram menores e menos detalhados.

Em 2017, uma nova modificação foi colocada em prática: os licenciamentos poderiam chegar ao Colit já com a aprovação prévia pelo presidente, o secretário estadual de Meio Ambiente, em casos enquadrados como situação de emergência. É o chamado Ad referendum, expressão em latim para caracterizar uma decisão que já havia sido tomada e só precisava de confirmação. Esse recurso foi usado na discussão da Faixa de Infraestrutura, conjunto de obras previstas para Pontal do Paraná, incluindo uma nova rodovia rasgando um trecho conservado de Mata Atlântica

Obras em Pontal do Paraná
Projeto do governo do Paraná prevê a construção de uma faixa de infraestrutura em Pontal do Paraná para desafogar a PR-412 e para ligar a PR-407 à Ponta do Poço, no balneário de Pontal do Sul, onde estará localizada a Zona Especial Portuária. As principais obras seriam a construção da nova rodovia, a dois quilômetros da PR-412, e o canal de drenagem.

A evocação de caso de situação de emergência causou debate. Sem maioria de votos, o único instrumento que sobrou a ambientalistas foi o pedido de vista. O caso foi parar na Justiça, diante da aprovação imediata do projeto. Contudo, passado o tempo de reavaliação do processo concedido pelo Judiciário, mesmo com o parecer da Universidade Federal do Paraná (UFPR) contestando aspectos do estudo de impacto ambiental e questionando a falta de conexão com qualquer projeto estruturante para o Litoral, o projeto foi aprovado.

Agora, com o decreto de fevereiro que retira do Colit a anuência de licenciamentos, a atribuição do conselho fica ainda mais confusa, quase inútil – sem corpo técnico para fazer avaliações mais aprofundadas e sem poder de decisão. Resta saber o rumo que o governo Ratinho Junior pretende dar ao Colit.

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