Mapeamento identifica estudantes internacionais na rede pública municipal de Foz do Iguaçu

São 1.154 estudantes, de 26 nacionalidades; objetivo do levantamento é fornecer dados para ações e criação de políticas públicas

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A rede de educação de Foz do Iguaçu recebeu, no ano passado, 1.154 alunos internacionais, distribuídos em 49 Centros Municipais de Educação (CMEIs) e 50 Escolas Municipais de Ensino Fundamental (EMEFs) – séries iniciais, que juntos, atenderam, aproximadamente, 27 mil estudantes. Os dados fazem parte do Mapeamento Demolinguístico de Estudantes Internacionais na Rede Municipal de Educação de Foz do Iguaçu, fruto de um projeto de extensão da UNILA, coordenado pelo docente Ariel Matías Blanco.

Os números mostram crescimento em relação ao primeiro levantamento, realizado em 2019, que identificou 442 estudantes internacionais no ensino fundamental. O que mais surpreende, no entanto, é a diversidade de nacionalidades das crianças: 15 nos CMEIs e 24 em EMEFs. “Há uma tendência marcadamente ascendente no que tange ao ingresso de estudantes internacionais. Nós já esperávamos um grande número de estudantes, mas não tínhamos a dimensão da diversidade de línguas e nacionalidades declaradas tanto pelos pais ou responsáveis quanto pelas próprias crianças”, comenta Ariel Blanco, autor do relatório sobre o levantamento de dados, em parceria com Fabiano de Augustinho, da Secretaria Municipal de Educação.

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Os dados foram levantados por meio do formulário de matrícula. O trabalho, explica Blanco, conceitua como internacionais estudantes que são migrantes, mas também aqueles que moram em cidades do Paraguai ou Argentina, por exemplo, e, ainda, brasileiros com trajetória escolar internacional – ou seja, que tiveram educação formal em outros países e retornaram ao Brasil. No relatório, é possível observar que muitos alunos internacionais aparecem tendo a nacionalidade brasileira ou como país de origem o Brasil. Segundo Blanco, isso acontece porque as secretarias das escolas registram o aluno como brasileiro, mas ao observar suas trajetórias escolares prévias, percebe-se que eles conhecem outras línguas. “Para o processo de ensino e aprendizagem, é preciso considerar não só a nacionalidade oficial, mas todo o repertório linguístico que eles têm”, completa.

Para ele, as informações sobre as línguas de domínio são importantes para a gestão da escola e para os professores porque “são eles os responsáveis por planejar tanto as tarefas das aulas como atividades institucionais como uma feira, um evento, considerando as nacionalidades ou as histórias internacionais dos alunos”.

Crianças de nacionalidade venezuelana são a maioria nos CMEIs, com 101 matrículas, seguidas pelas paraguaias (94). O CMEI Ramona Rodrigues Dotto é o que tem o maior número (27) de alunos internacionais matriculados. No ensino fundamental, as primeiras posições se invertem: paraguaios somam 353 matrículas e venezuelanos, 337. A EMEF Professora Elenice Milhorança é o que tem mais alunos matriculados: 56.

Essa divergência também se apresenta quando analisadas em conjunto a nacionalidade e o país de origem. “Às vezes, a pessoa não se identifica com determinada nacionalidade, mas tem aquele país como origem. Então, tem essa variação, mínima em alguns casos, mas que às vezes traz uma informação que, para a escola, pode ser relevante em algum momento”, pondera.

No mapeamento, também foram observados atributos como o uso de línguas adicionais. Entre os alunos da educação infantil – creche e pré-escola – 32,6% são bilíngues, com predomínio dos falantes de português e espanhol (31,1%). Mas também foram identificadas crianças falantes de espanhol e guarani; português e árabe; português e inglês; português e crioulo; e árabe e turco. O bilinguismo no ensino fundamental (1º ao 5º ano) alcança 40,95% também com predomínio da dupla português-espanhol (37,5%), mas com uma variedade maior de outras línguas como bengali, alemão, russo, italiano, coreano (veja o relatório completo).

As crianças com domínio de três línguas são apenas 1,98% com predominância do espanhol-guarani-português e estão matriculadas no ensino fundamental. “O guarani tende a estar sub-representado nas declarações”, avalia Blanco. “As línguas minorizadas – como o guarani – podem não ser informadas pelos responsáveis quando falam dos seus filhos como quando falam de si mesmos. Isso é uma coisa que vem historicamente, e muitas vezes está associada ao temor de sofrer discriminação ou preconceito linguístico.”

As respostas ao formulário de matrícula mostram que mais de 80% dos estudantes internacionais e de 85% dos responsáveis pelas crianças têm conhecimentos da língua espanhola. “O espanhol está muito presente. Isso também é importante para pensar políticas, para o planejamento.”

Políticas de atendimento

Quando calculados em relação ao total de estudantes nos CMEIs e EMEFs, o percentual de alunos internacionais é de menos de 5%. “Mas a gente não tem que considerar a porcentagem. Porque, mesmo sendo uma população pequena é fundamental, no sentido da inclusão, do acolhimento, ter um planejamento específico para esse grupo. A gente não pode invisibilizar”, comenta Blanco, lembrando que um professor do município, em um evento, observou que os 1.154 alunos equivalem a aproximadamente à população média de duas escolas. “São duas escolas completas de alunos que não têm o português como primeira língua.” Segundo ele, algumas escolas, que podem ser consideradas como referência, já vêm incorporando os diferentes repertórios linguísticos nas práticas de acolhimento e no cotidiano escolar. “Tem escolas que têm mais experiência e mais ferramentas para trabalhar com essas famílias, porque não é só o aluno, são as famílias”, pontua.

Por isso, diz Blanco, instrumentos como o mapeamento são importantes para a definição de políticas para o atendimento a esses estudantes. “A gente não pode deixar que apenas a boa vontade ou interesse individual de uma diretora, uma secretária ou um professor seja o que oriente as práticas. Por isso, a importância da construção de projetos coletivos, de formação continuada”, diz, reforçando que o relatório é voltado para toda a comunidade escolar. Para ele, o uso dos dados é também um grande desafio. “Porque o pior que pode acontecer é que essas informações não sejam consideradas e não sejam utilizadas ao serviço da comunidade escolar. O desafio é tentar a unificar critérios e interesses para que essa diversidade possa ser reconhecida e valorizada.”

O docente ressalta que, em atividades desenvolvidas na rede municipal de educação, nos últimos dois anos, foi possível perceber que os professores estão preocupados com o acolhimento dos estudantes internacionais. “Há muito conhecimento, muitas tentativas, muitas correções, reflexões”, descreve. “Os professores estão trabalhando e, muitas vezes, quando eles não conseguem, não é porque não querem, é porque está faltando algum tipo de informação.”

Apesar de o número de estudantes internacionais na rede municipal de educação apresentar crescimento, Blanco ressalta que os resultados do levantamento “são conservadores” por dois motivos principais. Primeiro, porque o formulário preenchido no momento da matrícula teve de ser limitado em sua extensão por questões de praticidade e também porque alguns pais, por motivos diversos, podem fornecer informações parciais ou incompletas, como o fato de a criança falar espanhol, por exemplo. “É uma realidade complexa e o conhecimento sobre línguas e nacionalidades precisa ser melhorado a partir de outras formas de pesquisa e de trabalho. Este mapeamento é apenas um instrumento de um conjunto que a gente precisa ter”, analisa o docente.

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@fozdiario


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