Digão Monzon
Em 2001 tentávamos, mais uma vez, organizar as bandas de Foz em um coletivo. Sugeri o desastroso nome de “Sindicato do Crime”, isso porque os shows eram constantemente interrompidos pelas polícias e fiscalizações e as vezes apareciam até nos policialescos da televisão.
Nessa época nossa região atravessava um período longo de estiagem e, segundo as emissoras de televisão, a falta de chuvas havia comprometido por completo a alimentação Aldeia Indígena Avá-Guarani do Ocoí, em São Miguel do Iguaçu.Com ajuda do João que era dono do Lá na Lua bar, Adilson Borges, Ronildo Pimentel jornalista e ancião da galera e de algumas bandas, resolvemos levantar um show pra arrecadar alimentos.
Não lembro exatamente quais bandas tocaram, mas o show foi um sucesso – conseguimos dois tonéis cheios, penso que uns 500 kg de comida. Lógico que além de arrecadar tínhamos a missão de entregar tudo isso. O Muffato nos emprestou um pequeno caminhão baú e lá fomos Ronildo, Doka (Blearg?), Kléber (Extrema Agressão) e eu (Bloodshot). Viajamos dentro do baú balançando e sacudindo por quase 2 horas. Mesmo com todo sofrimento a ida foi de muita conversa, risadas e causos.
Chegando lá fomos recebidos e acolhidos pelo cacique e sua família. Mesmo agradecidos pela comida nos revelaram que a situação deles era diferente da alardeada pela mídia. O problema não era a estiagem, com a qual sabiam lidar, mas com o inconstante nível do rio, provocado por Itaipu e também, da discriminação que sofriam cada vez que procuravam algum serviço público na cidade. A estiagem comprometia sim a produção que eles vendiam para comprar comodidades como roupas e querosene, mas não tanto a alimentação da tribo.
Conhecemos toda a aldeia, a escola, ouvimos músicas e algumas histórias e mesmo com toda a gratidão daquelas pessoas saímos de lá com a certeza de que havíamos sido enganados (mais uma vez). Voltamos sacolejando no caminhão em silêncio.
* @Digão Monzon é músico e jornalista em Foz do Iguaçu.