Greca não gosta do andar de baixo

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João Arruda

O prefeito Rafael Greca (DEM) não está nem aí para o andar de baixo. Ficou explícito na campanha eleitoral quando disse ter vomitado por nojo de pobre. “Nunca cuidei dos pobres, não sou são Francisco de Assis. Até porque a primeira vez que tentei carregar um pobre ‘pra’ dentro do meu carro eu vomitei por causa do cheiro”, disse o então candidato em setembro de 2016 levando a disputa para o segundo turno.

Greca venceu a eleição descendo a borduna no oponente. Do pescoço para baixo foi só canelada e o então candidato do PMN ocupa hoje o quarto andar do Palácio 29 de Março.

Desde 2017, o prefeito só pensa naquilo, mudou de partido, se aconchegou com Ratinho Junior, impôs ao seu vice a troca do PSDB pelo PSD e apagou das redes sociais as constrangedoras fotos ao lado de Beto Richa (PSDB) e de outros enrolados na justiça ou no limbo do esquecimento público.

A aversão ao andar de baixo ficou como uma fratura exposta desde o início da pandemia do coronavírus em março. Antes, a marquetagem funcionava até que bem. Na pandemia, o prefeito titubeou por diversas vezes entre as medidas restritivas e a pressão sobre o retorno da circulação nas ruas, da produção, dos serviços e da atividade econômica. 

Taqualmente ao novo aliado do Palácio Iguaçu, o prefeito tem evitado, digamos, os assuntos polêmicos. Não foi contra, nem a favor, muito pelo contrário, repetiu ad infinutum a respeito das recomendações do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde. Greca ficou em cima do muro como um tucano praticante e juramentado.

Mas nada é tão ruim que não possa piorar, pelo menos na periferia. O prefeito solerte, só chora na frente das câmeras de TV, aproveitou o coronavírus e provocou um pandemônio nos bairros e na vida dos mais pobres. De chofre, mandou fechar 26 postos de saúde. Apesar de ter recebido R$ 182 milhões do governo federal, 30% das unidades de saúde foram fechadas. A medida faz que curitibanos e curitibinhas se desloquem em ônibus lotados e enfrentem filas para remédios ou atendimento médico. 

O prefeito também deixou na mão, ou suscetíveis ao contágio, os servidores municipais de saúde. Tanto que a juíza Patrícia de Almeida Gomes Bergonse, da 5ª Vara da Fazenda Pública, determinou que a prefeitura forneça os equipamentos de proteção individual (EPIs) a todos os servidores da saúde pública que trabalham no enfrentamento do coronavírus. Além disso, os profissionais considerados do grupo de risco precisam ser afastados de suas funções.

No dia 29 de março, os servidores protestaram no aniversário de Curitiba. No calçadão da XV, as faixas deixaram o prefeito com engulhos: passagem de ônibus mais cara do Brasil, aumento da miséria na cidade, aumento da violência nas escolas e creches, e falta de médicos e remédios no SUS. A Curitiba do jardim de luz e cheia de rosa só existe nos vídeos de propaganda e para alguns apaniguados.

A pandemia revelou também quanto a prefeitura é perversa com os trabalhadores e alguns serviços. Além do coronavírus, do isolamento social, do baixo movimento, os taxistas sofrem com a taxa de outorga mais cara do Brasil. É uma categoria que historicamente apoia a logística do transporte, embora tratada muito diferente do que as empresas do transporte coletivo que estão recebendo uma mesada de milhões de reais por mês. E o prefeito nem aí. Não tomou qualquer medida que amenize os impactos econômicos sobre os taxistas – uma delas é a isenção total da taxa de outorga. 

Chegamos ao transporte coletivo. O prefeito fez com que Câmara de Vereadores aprovasse um pacote de R$ 200 milhões para ele gastar como quiser. Desse dinheiro, R$ 54 milhões estariam reservados aos empresários do transporte coletivo em três parcelas de R$ 18 milhões mensais. O mais grave: a empresa tem um “cliente” como a prefeitura há mais de 50 anos e já ganhou muito dinheiro. Se agora, o número de passageiros diminuiu na década de 1980, proporcionalmente, transportava mais passageiros que o metrô em Londres.

Essa empresa tem história na cidade, uma situação contábil muito melhor do que qualquer outra pequena empresa como uma panificadora, salão de beleza e de outras empresas que sofrem mais para pagar a folha de pagamento. Os donos da empresa estão usando como argumento que o dinheiro que será repassado para pagar a folha de cobradores e dos motoristas. Será que não têm caixa, patrimônio, para os salários dos funcionários por uns três meses? Será que têm menos condições do que a panificadora da esquina?

Mas se for para discutir transporte público vale a pena debater o seguinte. Com as subvenções do Estado e da prefeitura, mais esse repasse mensal para as empresas, para que então ter uma concessão de transporte? Não faz o menor sentido. É melhor ter uma frota pública e com esse dinheiro comprar novos ônibus.

Além dos ônibus, a prefeitura pode fazer a manutenção da frota e com a criação de uma cooperativa de cobradores e motoristas, um convênio com a cooperativa para operar o sistema de transporte coletivo. Vai gastar muito menos, além de ter uma tarifa sem margem de lucro aos empresários e sem pró-labore aos diretores. Custará muito menos e vai sobrar dinheiro para a saúde, o principal gargalo e principal demanda da população.  

Hoje, como está, não tem sentido se fazer uma concessão no transporte coletivo, muito menos os repasses pretendidos pelo prefeito. Seria o mesmo absurdo se o Estado repassasse recursos às pedageiras, alegando que os trabalhadores que ficam nas praças não podem receber por conta da crise. Vamos bater na madeira. 

Por que as empresas que exploram a concessão do transporte público não fazem empréstimo nos bancos, elas não têm uma situação boa para isso? Uma realidade bem diferente nas pequenas empresas. Esses repasses de dinheiro público é mais escândalo, um troço maluco que está acontecendo.

E daí? Será assim que pensa o prefeito. Verbetes tão comuns aos poderosos de plantão durante a pandemia. Só para registro: Curitiba vai receber R$ 224.185.726,11 de auxílio federal. O que a prefeitura fará com esse dinheiro? Apesar do choro em frente as câmeras, tem gente esfregando as mãos e lambendo os beiços como quem devora um ambulante.

João Arruda é presidente estadual do MDB

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