Voluntários lutam pela reconstrução do monumento que ficava no túmulo do naturalista polonês, patrono da ornitologia paranaense, enterrado dentro do Parque Nacional do Iguaçu
O que aconteceu em Foz do Iguaçu no último sábado, dia 15 de abril de 2023, entre 19h e 21h, na Paróquia Bom Jesus do Migrante, bairro Vila Portes, foi muito especial. Na prática era para ser só uma missa para celebrar a vida de um naturalista polonês chamado Tadeusz Chrostowski, patrono da ornitologia paranaense. Ele realizou três expedições ao Paraná para fazer um levantamento da fauna, flora e da diversidade desse estado brasileiro. Infelizmente foi surpreendido pela morte, vítima de malária, no segundo ano de sua terceira viagem ao Paraná.
A morte de Chrostowski aconteceu numa quarta-feira, 4 de abril de 1923, na precária instalação de apoio da linha de telégrafo ao longo da histórica Estrada Estratégica onde morava o caseiro (identificado por Tadeusz Jaczewski – naturalista responsável pelos registros da expedição) como Pedro de Paula Marins, também chamado Pedro Castellano. O local se chamava Pinheirinhos, a 72 quilômetros de Foz do Iguaçu.
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Em 1923 as terras às margens da Estrada Estratégica (Estrada Guarapuava – Foz do Iguaçu) ainda não estavam no Parque Nacional do Iguaçu. Porém, o Parque estava em “gestação” desde 1919, quando o Governo do Paraná adquiriu os 1.028 hectares ao redor das Cataratas do Iguaçu, terras que haviam sido doadas ao colono Jesús Val pela Colônia Militar do Iguaçu.
Em 1934, onze anos após a morte do naturalista polonês Tadeusz Chrostowski, a União Central Polonesa ergueu um monumento no local do sepultamento dele. O Parque só foi criado em 1939, embora desde 1931 o Governo Federal já tinha assinado decreto separando terras devolutas para a ampliação do Parque Nacional – o que aconteceu finalmente em 1944 e 1947, o que definitivamente colocou o túmulo de Chrostowski e remanescentes da antiga Pinheirinhos dentro do Parque Nacional do Iguaçu.
Mini expedição ao Túmulo
Depois dessa introdução podemos relembrar o que aconteceu no dia 15 de abril de 2023. Logo pela manhã foi realizada uma visita às ruínas do túmulo, com autorização do Parque Nacional do Iguaçu / ICMBio concedida ao professor Maurício Dezordi, residente em Medianeira, que encontrou o túmulo entre 2020/2021. A visita ao túmulo coordenada pelo professor Maurício teve a companhia do biógrafo de Tadeusz Chrostowski, o pesquisador Fernando Costa Straube e da esposa dele, a bióloga Ana Paula Caron. Estiveram também a jornalista Izabelle Ferrari, o esposo dela, Rodrigo Becker, a pedagoga Kathlen Marianne Ferrari e o jornalista e pesquisador do tema, Jackson Lima.
A Missa
A missa em homenagem ao naturalista polonês que na sua primeira viagem ao Brasil veio como imigrante, construiu uma casa de madeira, plantou uma roça e fez um apiário foi uma homenagem ao homem que logo descobriu que a dedicação simultânea à agricultura e a pesquisa não se complementavam.
A missa foi apropriadamente realizada na Paróquia Bom Jesus do Migrante, localizada em um bairro de Foz do Iguaçu (Vila Portes) – a poucos quilômetros da cabeceira da Ponte Internacional da Amizade, às portas do Paraguai. Uma região que nasceu de um loteamento criado por uma família também, em alguma época, imigrante. A Vila, desde seu começo, atraiu sulistas de diversas descendências, libaneses, paraguaios, argentinos, brasileiros de todo o Brasil, quer como empreendedores ou empregados se dedicaram ao comércio com o Paraguai, uma área de grande movimentação de viajantes, compristas, migrantes, exportadores, importadores, carga e descarga de caminhões, logística e desafios de migração.
Foi uma missa celebrada por dois padres. O padre Albino Matei, de descendência italiana, falante de “Talian” e nascido no Rio Grande do Sul, foi pároco em vários locais no Paraguai para atender as nascentes comunidades de “brasiguaios”. O padre visitante, Zdzislaw Malczewski, veio de Porto Alegre. A pedido do padre Albino, ele foi feito o celebrante oficial e o padre Albino co-celebrou. Dez pessoas vieram de Virmond, cidade no Paraná a quase meio caminho entre Foz do Iguaçu e Curitiba. Virmond foi colonizada por poloneses e teve em comum com Foz do Iguaçu a presença do padre Guilherme Thieleczek, o primeiro prelado do Oeste do Paraná, na época tudo parte do gigantesco município de Foz do Iguaçu.
Oito dos virmondenses lembraram a cultura entrando na igreja com roupas típicas da Polônia e portando a bandeira do país de seus avós, o brasão da Polônia e a imagem de Nossa Senhora de Monte Claro, a Virgem Negra. O encontro de herdeiros do legado do naturalista cuja obra principal conhecida tem a ver com os pássaros também foi emocionante.
Estiveram presentes representantes de instituições ou empresas como o Parque das Aves, o Refúgio Biológico de Itaipu e do Grupo de Observadores de Aves de Foz do Iguaçu, além de interessados no tema e pessoas da comunidade dispostas a participar da homenagem. Houve a presença ainda do professor e historiador Maurício Dezordi, de Medianeira, que encontrou e levantou material sobre o túmulo do naturalista. Ele trouxe parte da lápide original que foi apresentada como ofertório durante a missa.
O encontro de todos esses profissionais com o pesquisador de ornitologia e autor prolífico sobre o tema no Paraná, Fernando Costa Straube e a esposa também bióloga Ana Paula Caron foi uma amostra do sucesso do evento: reunir pessoas que pudessem dar continuidade ao esforço de não deixar que Tadeusz Chrostowski, sua expedição, seus companheiros e seus estudos sejam esquecidos.
Em suas palavras na paróquia, Straube lembrou da dívida importante que se estende não somente àqueles que reconhecem o legado deixado por essas pessoas formidáveis. “Refiro-me aqui à memória daqueles que ofereceram sua própria vida ao pouco que ainda conhecemos sobre a nossa natureza”. Encerrou dizendo: “Que essa celebração nos traga o passado como uma reflexão para o futuro”.
Durante a missa, os padres mantiveram o mesmo raciocínio, apresentando Chrostowski e seus companheiros como exemplo de quem dedicou sua vida para entender a natureza e permaneceu firme no propósito e graças a eles o Paraná tem hoje um lugar privilegiado na ornitologia brasileira.
E para coroar a atmosfera de reflexão e agradecimento, Estanislau Borecki Neto, neto de Stanisław Borecki – o taxidermista da expedição – dirigiu de Curitiba até Foz do Iguaçu, acompanhado da esposa e dos filhos, para estar presente à Missa.
A família expôs no ofertório uma bússola e um relógio do taxidermista Borecki, ambos usados na viagem. Nas preces lidas na cerimônia, fizeram parte pedidos pelas almas dos migrantes poloneses Tadeusz Chrostowski, Tadeusz Jaczewski e Stanisław Borecki, e por todos os que acreditaram na missão que eles vieram desenvolver no Brasil, 100 anos atrás. E pediu pelos descendentes das famílias Chrostowski, Jaczewski e Borecki, “para que sigam honrando o legado deixado por seus antepassados”.
Mas as surpresas não pararam por aí. O grupo de cantos apresentou a canção oficial da devoção à Padroeira da Polônia “Czarna Madonna”. Por fim, os padres pediram aos presentes que se juntassem ao coro para cantar o Parabéns ao neto de Stanisław Borecki que, além de ter o mesmo nome do avô, celebrava o aniversário na data da missa que ficará histórica – também data do aniversário do avô.