O nome das espécies recém-descobertas homenageiam a cultura indígena local. A Anisophya una, única espécie de coloração preta do seu gênero, tem em seu nome a palavra una, que significa preto em guarani e única em latim
Uma publicação na revista internacional Zootaxa documenta a descoberta de três novas espécies do inseto conhecido como esperança, no Parque Nacional do Iguaçu (PNI). A descrição das espécies é o resultado da pesquisa do biólogo Marcos Fianco, mestre em Biodiversidade Neotropical pela Universidade Federal da Integração Latino-Americana. O trabalho foi orientado pelo professor Luiz Roberto Ribeiro Faria Junior.
Durante as pesquisas para a dissertação de mestrado, Fianco se propôs a fazer um inventário de todas as espécies de esperanças que habitam no Parque e descrever os cantos de cada uma delas. No total, foram encontradas 83 espécies, entre elas, mais de dez ainda desconhecidas pela ciência. “O resultado revelou o PNI como o detentor da segunda maior fauna local da América do Sul para o grupo, e isso reforça ainda mais a importância do Parque para a preservação ambiental”, salienta Fianco.
Com a publicação, três novas espécies já são reconhecidas oficialmente pela Ciência. Mas, em breve, após a publicação de outros artigos, outras espécies da região, descobertas pelo pesquisador e seus orientadores, também serão apresentadas.
O nome das espécies recém-descobertas homenageiam a cultura indígena local. A Xenicola taroba lembra o guerreiro Tarobá, da lenda das Cataratas. A Xenicola xukrixi foi batizada assim por ser uma espécie de pernas longas. Xukrixi significa aranha pequena em kaingang. E a Anisophya una, única espécie de coloração preta do seu gênero, tem em seu nome a palavra una, que significa preto em guarani e única em latim.
O canto das esperanças
Para conseguir fazer o inventário faunístico das esperanças, o pesquisador passou, durante um ano, quase 40 dias morando no Parque Nacional do Iguaçu. O levantamento foi feito em várias áreas do Parque, nos municípios de Foz do Iguaçu, Serranópolis do Iguaçu, Céu Azul e Santa Tereza do Oeste.
“A cada expedição de campo, eu ficava de dois a cinco dias alojado no PNI. As coletas eram feitas principalmente à noite, com o auxílio de um puçá, um tipo de armadilha feita com redes”, explica Marcos Fianco, que recebeu bolsa da Capes para realizar a pesquisa. Depois da coleta, os insetos foram levados para os laboratórios da UNILA, onde o mestrando gravou o canto e analisou a morfologia das esperanças. Hoje, a coleção de esperanças coletadas está em caixas entomológicas no acervo do Laboratório de Biodiversidade da UNILA e será compartilhada com outras coleções científicas, como a da UFPR e a do Museu Nacional.
Durante a pesquisa, Fianco gravou mais de 150 horas de cantos de distintas espécies de esperanças, que foram descritos, de forma técnica, na dissertação. Ele explica que o canto é, na verdade, um som produzido pelos machos ao friccionar as asas, com o objetivo de atrair parceiras.
AQUI para ouvir o canto da esperança Anisophya melacholoris
“O canto é uma das características que diferenciam as espécies do inseto. A Xenicola xukrixi, por exemplo, estridula (canta) a uma frequência de 73 kilohertz (kHz), altíssima para o grupo e mais de três vezes superior à acuidade do ouvido humano. Usamos um gravador específico que consegue detectar sons ultrassônicos”, ressalta.
A importância do levantamento faunístico
A pesquisa serve de pontapé inicial para que novos estudos sobre as esperanças sejam desenvolvidos. “Esta é considerada uma pesquisa alfa. Então ela pode levar a novas pesquisas nas diversas áreas do conhecimento. E isso é muito positivo, porque hoje, no Brasil, não há pesquisadores que estudem especificamente as esperanças. Temos alguns especialistas em ortópteros, mas focados em grilos e gafanhotos. Então, o campo de pesquisa ainda é muito grande”, afirma o mestre em Biodiversidade.
Natural do município de Pato Branco, Fianco defendeu a dissertação na UNILA no final do mês de julho. A descrição científica das novas espécies foi realizada junto com o pesquisador Holger Braun, da Divisão de Entomologia do Museu de La Plata (Argentina) e especialista em esperanças.
O professor do mestrado e orientador do trabalho, Luiz Roberto Ribeiro Faria Junior, lembra que as pesquisas que descrevem a biodiversidade são uma etapa fundamental para ampliar o conhecimento e destacar a importância das áreas naturais.
“Esta pesquisa só reforça o quanto o Parque é absurdamente rico e diverso. É uma área essencial para manter a biodiversidade da região e da Floresta Atlântica de interior. Nos surpreendemos em descobrir a quantidade de espécies de esperanças que temos no Parque. Uma informação que ainda era desconhecida, já que nunca tinha sido realizado um levantamento desse tipo”, disse.
O docente lembra que o mestrado em Biodiversidade Neotropical da UNILA está desenvolvendo pesquisas sobre vários outros grupos, como algas, sapos, abelhas e moscas. “Uma das coisas com que mais podemos contribuir é fornecer essas informações básicas sobre a biodiversidade da região. A qualidade da informação na biologia está relacionada à identificação bem feita das espécias. A partir desses dados, conseguimos trabalhar várias perguntas ecológicas e evolutivas”.