Documento traz aspectos sanitários, pedagógicos e psicológicos que devem ser discutidos para uma retomada segura das atividades presenciais em todos os níveis de ensino
Embora ainda não seja recomendado o retorno às aulas presenciais, escolas públicas e particulares já podem iniciar um planejamento da retomada das atividades em médio prazo. O grupo de pesquisadores da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) que estuda projeções da Covid-19 em Foz do Iguaçu publicou, nesta semana, um informe que lista algumas recomendações para construir uma estratégia sólida de volta às aulas com segurança. Para ver o relatório na íntegra clique AQUI.
O documento aborda os aspectos sanitários que deverão virar rotina e também alerta que o planejamento deve incluir discussões sobre as demandas pedagógicas e psicológicas de estudantes, professores e demais profissionais de educação. As recomendações são o primeiro passo para propor medidas para um retorno às aulas presenciais de forma gradual, com o maior nível de segurança possível. Mas o documento considera que, eventualmente, a depender do impacto da abertura das escolas na curva de novos casos de Covid-19, poderá ser necessário retroceder nessa estratégia. “No cenário atual, as certezas são poucas e as circunstâncias rapidamente se modificam, mas existem hipóteses e experiências em curso em outros países e regiões do Brasil, nas quais é possível se embasar para oferecer material para reflexão e tomada de decisões”, explica a médica infectologista e professora da UNILA, Flávia Trench, autora principal do relatório.
Flávia explica que cada instituição de ensino deve ser pensada e tratada como um indivíduo único. O planejamento deve levar em consideração a realidade da comunidade escolar, que deve ser chamada para participar ativamente do processo de retorno às aulas. “É fundamental que todos sejam ouvidos em suas dúvidas, angústias e expectativas com o retorno às aulas, seja na modalidade presencial ou a distância. Acolhimento e escuta sem julgamentos são primordiais nessa hora”, salienta Flávia.
No âmbito da gestão, a Secretaria de Educação deve estabelecer com a Secretaria de Saúde local um diálogo direto, trabalhando de forma coesa para viabilizar um retorno seguro e tranquilo. Professores e funcionários escolares devem ser preparados para o período pós-retomada para que, no momento do retorno, o ambiente escolar seja de amparo, acolhimento e segurança. “Não deve haver tanta preocupação inicial em vencer conteúdos ou cumprir grade de disciplinas. Talvez este seja o grande momento de inovações, há muito tempo desejadas e esperadas na educação”.
Evitando aglomerações
Em um primeiro momento, o retorno às atividades presenciais deve ser facultativo. Para quem optar por retornar às atividades presenciais, os horários de entrada, saída e intervalos devem ser diferenciados, de forma a minimizar as aglomerações. E, de acordo com a pesquisadora, as turmas serão como pequenos “casulos de convivência”. Cada grupo de alunos e professores deve ser mantido fixo, de forma que, no caso de algum sintomático respiratório, rapidamente seja possível identificar os comunicantes e isolá-los em ambiente domiciliar.
O documento não especifica um número ou porcentagem de pessoas que poderão frequentar a escola. Porém, ele coloca que as classes devem comportar alunos em número que permita distanciamento de 1,5 a 2 metros entre as carteiras. Sugere-se a redução do tempo que os alunos permanecem na escola, de forma a permitir a inclusão de todos os estudantes (em sistema de rodízio) e de manter a ventilação e a higienização frequentes de cada sala de aula. Uma das propostas é que as aulas aconteçam em dias ou semanas alternadas.
Cuidados sanitários
A segurança e a tranquilidade no retorno à sala de aula vão depender do comprometimento individual dos membros da comunidade escolar em seguir as orientações e cuidados necessários nesta nova etapa. Por isso, a professora Flávia Trench acredita que a escola deve levar informações que estimulem “a responsabilidade por si mesmo, pelo outro e pela comunidade, bem como o cuidado com o ambiente coletivo”.
O relatório incentiva, por exemplo, que as turmas adotem cumprimentos alternativos “para substituir os tão necessários abraços e beijos, de forma que todos possam expressar a alegria do reencontro diário, sem violar o distanciamento social e de forma divertida”. O uso de máscaras também é fundamental, e devem ser propostas estratégias para que todos tenham acesso a elas e saibam como vesti-las, retirá-las e higienizá-las. “Os alunos podem ser convidados a personalizar suas máscaras e a estudar sobre o porquê da importância delas”, sugere Flávia.
A higienização das mãos deverá ser uma prática constante, feita na entrada e na saída da escola e da sala de aula, e também a cada duas horas. Idealmente, a higienização deve ser feita com álcool em gel em dispensers individuais. Os alunos também deverão ser incentivados a higienizar sua carteira e cadeira com álcool após o uso, sob supervisão. Outra orientação é que cada estudante traga e utilize sua própria garrafa de água, utilizando os bebedouros comuns apenas para enchê-la novamente.
As instituições de ensino também devem incentivar que cada aluno, professor e funcionário realize uma autoavaliação de possíveis sintomas. Indivíduos com sintomas respiratórios, cefaleia e sintomas digestivos serão orientados a permanecer em casa em isolamento domiciliar e a entrar em contato com o Plantão Covid-19, para agendamento de exames, notificação e recebimento de atestado de isolamento familiar. Protocolos internos para o isolamento e testagem dos sintomáticos e dos contatos próximos (principalmente colegas e professores da mesma classe) também poderão ser instituídos, em parceria com a Secretaria de Saúde.
Proteção aos vulneráveis
O planejamento do retorno das atividades presenciais deve incluir um levantamento de quem são os alunos e os profissionais com risco potencial de apresentar a forma grave da Covid-19. Para essas pessoas, a presença nas atividades escolares não é aconselhada. “Mesmo não retornando fisicamente, essas pessoas devem ser amparadas, de forma a se sentirem cuidadas e parte da comunidade escolar, e não excluídas”, comenta a infectologista Flávia Trench.
Esse levantamento deve incluir, ainda, um detalhamento dos problemas de cada membro da comunidade escolar, desde questões de saúde física e saúde mental até dificuldades econômicas e situações de violência. “Não se esquecer de levar em conta, neste momento, os familiares de risco, as condições de moradia e possibilidade de prática concreta de distanciamento social dentro da residência dos membros da comunidade escolar”, pontua Flávia. Mecanismos para amparar famílias em dificuldades econômicas e com risco social também devem ser discutidos pela comunidade escolar, em consonância com profissionais de assistência social.