O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) avalia a possibilidade de alteração de data e horário em concurso público para candidato adventista e decide se o administrador público deve estabelecer obrigação alternativa para servidor em estágio probatório que estiver impossibilitado de cumprir determinados deveres funcionais por motivos religiosos.
O advogado Gilmar Cardoso explicou que o assunto tratado no Recurso Extraordinário (RE) 611874 interposto pela União teve manifestação favorável do STF quanto à repercussão geral.
O Plenário Virtual da Corte, por votação unânime, considerou que o caso extrapola os interesses subjetivos das partes, uma vez que trata da possibilidade de alteração de data e horário em concurso público para candidato adventista.
O julgamento, iniciado na última quarta-feira (18), com a leitura dos relatórios, prosseguiu na sessão da quinta-feira (19) quando as partes envolvidas nos processos, as entidades interessadas admitidas pelos relatores e o procurador-geral da República, Augusto Aras, manifestaram-se sobre a possibilidade de mudança de data ou local de concurso público para candidatos que, em razão de sua crença religiosa (adventista), devem resguardar o sábado. O julgamento deve prosseguir na próxima quarta-feira (25), com os votos dos demais ministros.
O advogado Gilmar Cardoso que acompanha o tema afirmou que os Relatores divergiram sobre a diferenciação em concurso e estágio probatório em razão de crença religiosa, sendo que durante aa sessão desta quinta-feira (19), os ministros Dias Toffoli e Edson Fachin apresentaram entendimentos diferentes sobre a matéria.
Gilmar Cardoso destaca que o caso diz respeito à análise de um mandado de segurança, pela Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que entendeu que candidato adventista pode alterar data ou horário de prova estabelecido no calendário de concurso público, contanto que não haja mudança no cronograma do certame, nem prejuízo de espécie alguma à atividade administrativa. O TRF1 concedeu a ordem por entender que o deferimento do pedido atendia à finalidade pública de recrutar os candidatos mais bem preparados para o cargo. Essa é a decisão questionada pela União perante o Supremo.
O advogado Gilmar Cardoso registra que para Toffoli, relator do Recurso Extraordinário (RE) 611874, a realização da prova em dia considerado de guarda para determinados grupos religiosos, por si só, não caracteriza violação do direito de culto.
Fachin, relator do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1099099, considera que a implementação de medidas que assegurem a liberdade religiosa é compatível com o texto constitucional. O julgamento deve prosseguir na próxima quarta-feira (25), com os votos dos demais ministros.
Limitação do direito de crença
Em seu voto, Toffoli destacou, inicialmente, que o Estado deve assegurar a liberdade dos indivíduos de crerem que o sábado (ou qualquer outro dia da semana) deva ser resguardado às atividades religiosas, ainda que se trate de grupo minoritário. No entanto, não decorre desse fato o direito de exigir do Estado ou de particulares a modificação da forma de cumprimento de faculdades ou obrigações espontaneamente assumidas pelo fiel para adequá-la à crença por ele professada.
Gilmar Cardoso esclareceu que para o ministro, embora proteja a liberdade de crença e de consciência e o princípio do livre exercício dos cultos religiosos, a Constituição Federal não prescreve, em nenhum momento, o dever estatal de promover condições para o exercício ou o acesso às determinações de cada instituição religiosa. A seu ver, a possível limitação da prática religiosa em razão de previsão do edital de concursos, a depender das circunstâncias do caso concreto, não representa restrição intolerável à liberdade de crença. “Não se pode considerar violação do exercício do direito de culto, por si só, a realização de prova de concurso para ingresso em cargo público em data coincidente com o ‘período de guarda’, já que o dia selecionado previamente pela banca examinadora deve ser respeitado por todos os candidatos, indistintamente”, afirmou.
Interferência estatal
O advogado Gilmar Cardoso disse que, no entanto, para o ministro Edson Fachin, possibilitar alternativas a candidatos de certames não se trata de criar privilégio ou de estipular diferenciações para o provimento de cargos públicos, mas de permitir o exercício da liberdade de crença sem indevida interferência estatal. Fachin divergiu do voto do ministro Dias Toffoli, por entender que admitir a fixação de data alternativa para a realização de etapa de certame público ou de estágio probatório em razão de convicção religiosa não viola o direito à igualdade. Para ele, a implementação de prestações positivas que assegurem a plena vivência da liberdade religiosa é não apenas compatível, mas recomendada pelo texto constitucional (artigo 5º, inciso VII, e artigo 210, parágrafo 1º).
O julgamento deve prosseguir na próxima quarta-feira (25), com os votos dos demais ministros.
ENTENDA O TEMA NO ESTADO DO PARANÁ
Segundo o advogado Gilmar Cardoso, no Estado do Paraná, esta matéria já foi submetida ao debate no plenário da Assembleia Legislativa por duas oportunidades, tendo sido aprovada em ambas; no entanto, a questão foi vetada pelo Poder Executivo nas duas situações, em mandatos diferentes, pelos Governadores Roberto Requião em 2004 e Beto Richa em 2015. O texto do autógrafo de lei paranaense, inclusive, ampliava a situação para a obrigatoriedade dos estabelecimentos de ensino abonarem as faltas de alunos motivadas por princípio de consciência religiosa.