A UNILA, em Foz do Iguaçu, concedeu, pela primeira vez em sua história, um título de Doutora Honoris Causa. A homenageada foi a educadora popular, feminista e ativista ambiental Moema Viezzer, reconhecida internacionalmente por sua trajetória marcada pelo compromisso com os direitos humanos, a justiça socioambiental e a educação transformadora. A homenagem foi formalizada na última sexta (25), durante a 95ª Sessão Ordinária do Conselho Universitário (CONSUN).
A decisão, aprovada por unanimidade pelo Conselho, responde a uma demanda histórica de diversos setores da comunidade acadêmica da UNILA – incluindo o Observatório Educador Ambiental que leva o nome da homenageada –, docentes, estudantes e servidores que reconhecem a contribuição de Moema para a construção de saberes críticos e plurais na América Latina.
Natural do Rio Grande do Sul, Moema teve papel destacado durante e após o período das ditaduras militares na América Latina, atuando em diversos países como educadora popular e militante de causas feministas e ambientais. Seu trabalho na ECO-92, por exemplo, onde facilitou diálogos entre diferentes grupos, resultou na produção de documentos fundamentais que hoje são referências internacionais, como a Carta da Terra. Ela foi indicada, ao lado de outras mulheres do mundo, ao Prêmio Nobel da Paz, e mantém até hoje um vínculo afetivo e político com a região da Tríplice Fronteira.
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Homenagem
A sessão do CONSUN foi presidida pela reitora Diana Araujo Pereira e contou com a presença de diversas lideranças sociais, políticas e acadêmicas da região. A primeira fala foi da bibliotecária da UNILA Suzana Mingorance, cuja pesquisa no Programa de Pós-Graduação em Integração Contemporânea da América Latina (PPGICAL) trata dos acervos de memória e formação de redes sociais e populares a partir do acervo particular da Moema Viezzer, doado para a UNILA em 2018. Para Suzana, o material “se tornou para a nossa instituição uma riquíssima fonte de pesquisa e de memória latino-americana”.
A bibliotecária destacou que “hoje, com meu coração pleno de gratidão, agradeço o privilégio imenso de tê-la conhecido e a oportunidade de estar aprendendo ao seu lado. Receber, na biblioteca onde eu trabalho, o acervo da sua vida, suas memórias, sua arte, seu legado, que representa toda a história recente dos educadores populares latino-americanos, é com certeza um dos momentos mais importantes da minha própria história, porque ali você não doa apenas livros, você confiou a nós, à UNILA, a continuidade do seu florescer”.
A professora da UNILA Suellen Mayara Péres de Oliveira, uma das fundadoras do Observatório Educador Ambiental Moema Viezzer, também prestou sua homenagem, ressaltando que “a sua história, Moema, não conta a história de um indivíduo, de uma pessoa, ela conta a história dos movimentos sociais na América Latina, dos educadores populares que foram exilados, que tiveram que passar de país em país, como você; da Argentina para o Chile, do Chile para o México, para o Caribe, para o Haiti e, finalmente, lutaram pela redemocratização”. Para Suellen, a história de Moema “é a história da América Latina e do Caribe, é a história da resistência, é a história da educação popular”.
Para a professora Luciana Ribeiro, também fundadora do Observatório, Moema é “uma pessoa do antes e do depois. Você é aquela pessoa que por onde passa encontra uma situação, e quando você sai a situação é outra, as pessoas são outras e o mundo é outro”. Usando termos da biologia, ela acrescenta: “você é uma educadora rizomática, você é uma pessoa que vai deixando raízes, e essas raízes vão se entrelaçando e formando aquela floresta por debaixo da terra. Então, tem a parte que a gente vê, das sementes e dos frutos que vão surgindo. Mas tem a parte que a gente não vê, de como essas conexões vão se fazendo invisivelmente e permanecendo em condições de oferecer resistência, em momentos de necessidade, e potência, nos momentos de liberdade e criatividade”.
A reitora Diana pontua que “é uma honra para a nossa universidade que o seu primeiro doutorado honoris causa seja concedido a uma mulher latino-americanista, ambientalista e feminista, cujo legado alcança tanto o Oeste do Paraná quanto Bolívia, México, República Dominicana e muitos outros lugares”. Ela acrescenta que “Moema nos ensina que a inteligência coletiva se constrói com amor, empatia e solidariedade – valores essenciais para a construção de uma universidade decolonial e comprometida com o bem viver.” Durante a sessão do CONSUN, a reitora acrescentou: “Você já é parte da história da UNILA e agora será ainda mais presente na história da nossa instituição”.
Ao receber o título, Moema manifestou surpresa e alegria. “Confesso que me senti muito honrada e, não posso deixar de dizer, muito comovida por esse gesto que me causou grande surpresa e alegria”. Para a homenageada, “também é um momento de celebração para quem busca tanto avançar no diálogo de saberes e na interculturalidade, como um dos caminhos para a paz, que é tão desejado por nós nesse mundo tão tumultuado por conflitos e guerras entre países e territórios”.
A educadora comenta, também, que vê “nesse reconhecimento o valor de todo um saber construído coletivamente, do qual tive a oportunidade de fazer parte. A UNILA sempre foi, pra mim, um horizonte inspirador – uma universidade que nasce com o espírito da integração, da transdisciplinaridade, da decolonialidade”.
A professora da Unioeste e pesquisadora do PPGICAL Nelsi Kistemacher Welter também prestou sua homenagem. A cerimônia contou, ainda, com a presença de representantes de instituições e movimentos sociais da Região Oeste do Paraná e da tríplice fronteira, como Unioeste, Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu, Ecopolítica e Sobrevivência (Paraguai), Paraecológicos, entre outros.
Honraria
A concessão do título de Doutora Honoris Causa está prevista no Estatuto da UNILA e é uma das mais altas honrarias que uma universidade pode conceder a pessoas de destaque em suas áreas de atuação, mesmo que não tenham vínculo acadêmico formal com a instituição.