O Brasil é um país tão peculiar que, enquanto um bando de foliões seminu dançava até a exaustão nas ruas de Salvador, um distinto senhor de smoking, provavelmente lutando contra o jet lag e um canapé de caviar mal digerido, recebia um Oscar em Los Angeles. Pois é, meus amigos, no meio do ziriguidum, Walter Salles fez história e garantiu o primeiro Oscar de Melhor Filme Internacional para o Brasil com Ainda Estou Aqui.
O título do filme não poderia ser mais apropriado para um país que, a cada fevereiro (ou março, dependendo do humor do calendário), ressurge da própria ressaca e grita para o mundo: “Ainda estou aqui! Sambando, rebolando e, se possível, com um copo de cerveja na mão”. Mas, sejamos justos, nem só de frevo e glitter vive a nação.
Em São Paulo, por exemplo, há dois tipos de pessoas durante o Carnaval: aquelas que se enfiam em blocos de rua e aquelas que pegam o primeiro voo para um retiro espiritual no interior, onde a coisa mais excitante que acontece é um debate sobre os efeitos do glúten na alma. Enquanto isso, no Acre (sim, ele existe e celebra o Carnaval!), o governo organizou o Carnaval da Família, onde a maior preocupação era garantir que a festança fosse animada, mas sem comprometer a compostura.
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Já no Rio de Janeiro, entre um desfile da Vila Isabel assombrado por criaturas mitológicas e um “Blocão” lotado de cachorros fantasiados de super-heróis, tivemos um fato curioso: foliões decidiram homenagear Van Gogh, andando pelas ruas com fantasias que replicavam suas pinturas. Só podemos esperar que, ao contrário do artista, ninguém tenha terminado a noite sem uma orelha.
Em Minas Gerais, o Carnaval foi um caso de resistência. No Quilombo Campo Grande, Lula resolveu visitar um acampamento do MST pela primeira vez em seu mandato, talvez aproveitando para conferir se o Carnaval mineiro ainda segue aquela tradição de durar até a Páscoa. Já na Bahia, a Lavagem da Esquina do Padre, em Caetité, resgatou os antigos carnavais de marchinhas e foliões vestidos de “caretas”, porque nem só de abadás e Ivete Sangalo vive o folião baiano.
E para aqueles que evitam a folia por razões religiosas, fica aqui o reconhecimento: há algo de nobre em resistir à tentação da batucada e do álcool barato, enquanto o resto do país se debate em meio a confetes e desidratação. Mas convenhamos, fugir do Carnaval no Brasil é tão difícil quanto ignorar um boletim de ocorrência num grupo de WhatsApp de condomínio.
Seja em um bloco de rua ou em um retiro silencioso, seja recebendo um Oscar ou fantasiado de tela impressionista, o Brasil segue firme e caótico, provando que, independentemente da festa, ainda estamos aqui. E cá entre nós, isso já é um feito e tanto.