Dizem que escrever contra a extrema direita, ou qualquer outra forma de extremismo, é como acender uma vela em plena ventania: parece inútil, mas ilumina. A cada palavra contrária ao bolsonarismo caduco ou a visões estreitas da existência, surgem os inevitáveis rótulos — “petista”, “comunista” e, veja só, “ciclista”! Sim, porque na cabeça de certos extremistas, pedalar também virou prática subversiva. Talvez o problema esteja no equilíbrio que a bicicleta exige — algo que falta, e muito, ao radicalismo.
Mas, sejamos francos: escrever é um ato de cidadania. É plantar palavras no árido terreno da intolerância e esperar que, um dia, brotem ideias. Porque, no fundo, a verdadeira batalha não é entre direita e esquerda, mas entre memória e esquecimento. Esquecer, aliás, é o maior perigo. É o que abre espaço para que horrores do passado ressurjam travestidos de novidade.
Foi assim que me lembrei do meu velho amigo Nireu Teixeira Jr., juiz de direito e leitor voraz. Foi ele quem, muitos anos atrás, me trouxe as primeiras edições de Ascensão e Queda do Terceiro Reich, de William Shirer. Imagine só: um livro tão grande quanto os delírios de grandeza de quem o inspirou, mas igualmente necessário. Ali estavam expostas as engrenagens de um extremismo que, por mais que o tempo passe, insiste em nos assombrar com novos disfarces.
E aqui entra o humor. Porque, convenhamos, nada irrita mais um extremista do que ser alvo de piadas. Rir é resistir. É desarmar a seriedade arrogante de quem acha que a solução para o mundo é impor seus valores, como se a convivência pacífica fosse uma concessão insuportável. Por isso, acredito na diplomacia — no diálogo, no respeito, no encontro de diferenças. Talvez a vida fosse mais simples se todos pedalassem um pouco mais; afinal, ninguém nunca começou uma guerra enquanto equilibrava uma bicicleta.
Manter a memória viva é alimentar o futuro com lições que evitam o repeteco de tragédias. Seja lembrando o que aconteceu em Auschwitz, seja combatendo os arroubos do bolsonarismo ou de qualquer outro “ismo” que destrua mais do que construa. Diplomacia, minha gente, ainda é o melhor antídoto contra os excessos. Acreditemos nisso.
E, se me permitem, que sigamos como os ciclistas: equilibrados, resilientes, avançando mesmo contra o vento. Porque o caminho da memória, assim como o da justiça, não é uma estrada reta — é uma trilha cheia de curvas, mas que vale a pena percorrer.
Nello Morlotti